domingo, 30 de novembro de 2008

Tesouro

Da nova série "O que seria dos dias sem inspiração se não fosse a Mastercard...?!"

Episódio de hoje: Labiata
.
Violão: R$ 159,00

Ingresso para o show do Lenine: R$ 40,00

Transmitir uma paixão ao seu filho: não tem preço.

Tesouro

Da nova série "O que seria dos dias sem inspiração se não fosse a Mastercard...?!"

Episódio de hoje: Labiata
.
Violão: R$ 159,00

Ingresso para o show do Lenine: R$ 40,00

Transmitir uma paixão ao seu filho: não tem preço.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Felicidade

Promessa feita...


Promessa cumprida...


Um sorriso, um aperto de mão e um "obrigado"...

E para completar a felicidade...
 Pilar del Río!
.
Haja coração...
Até amanhã, meus caros, até amanhã...
.
Academia Brasileira de Letras, lançamento mundial do livro "A Viagem do Elefante", José Saramago, Rio de Janeiro, 2008.

Felicidade

Promessa feita...


Promessa cumprida...


Um sorriso, um aperto de mão e um "obrigado"...

E para completar a felicidade...
 Pilar del Río!
.
Haja coração...
Até amanhã, meus caros, até amanhã...
.
Academia Brasileira de Letras, lançamento mundial do livro "A Viagem do Elefante", José Saramago, Rio de Janeiro, 2008.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Um abraço em José

Passando os olhos pelo O Globo on line antes de dormir, vejo lá a matéria de Márcia Abos, fresquinha, publicada às 19h43min, com a chamada:
.
"Não sou pessimista, o mundo é que é péssimo", desabafa Saramago".
.
Como assim...???
Fiquei preocupada...
.
José Saramago está no Brasil para o lançamento do seu livro "A Viagem do Elefante" e inauguração da exposição "A Consistência dos Sonhos" que reúne mais de 1.200 peças do autor entre documentos, manuscritos, primeiras edições, agendas e coisa e tal.
.
Diz a matéria que esse homem, que me falou pela primeira vez de uma cegueira branca que era a minha; que me falou daquela coisa que não tem nome, que não tem certo, que não tem rota, que somos nós; que me falou da imensa responsabilidade daqueles que enxergam a miséria humana frente aos outros que apenas sofrem na mesma condição; que esse homem, hoje triste, "instaurou a perplexidade" entre os jornalistas, no Consulado de Portugal, na entrevista coletiva concedida esta tarde, ao declarar que:
.
"- Nessa longa história da humanidade, em que ponto tomamos uma direção errada que nos levou ao desastre que estamos hoje, do qual somos responsáveis? A literatura pode salvar o mundo? Mas salvar o mundo como? Principalmente depois de tudo o que já se escreveu. Como não conseguimos mudar o rumo de nossas vidas?"
.
[Como não? Como não?!! Como não???!!!!!!]
.
E continuou o mestre: "Quantos delinqüentes existem no mundo? A violência já atingiu o nível da barbárie. A corrupção chegou a tal ponto que é um problema de linguagem. A palavra bondade hoje significa qualquer coisa de ridículo. É preciso conquistar, triunfar. Ninguém se arrisca a dizer que o seu objetivo é ser bom. Querer ser bom em uma época como esta é se apresentar como voluntário para a eliminação. Como chegamos a isso? - indagou sinalizando que a saída é a transformação individual - para mudarmos a vida, é preciso mudarmos de vida".
.
Sim, José, é preciso mudarmos de vida, para mudarmos a vida, sem dúvida, e seguindo o mesmo raciocínio, é preciso salvarmos a nós mesmos para salvarmos o mundo. E quando se pergunta se a literatura pode salvar o mundo, fico aqui pensando em quantas vidas não já foram salvas, não mudaram de rumo, de rota e se transformaram por completo através da literatura, da SUA literatura, José, quantas? Penso que o mundo é salvo assim: toda vez que uma vida é salva. É o mundo de cada um, é a vida em sua melhor expressão. E A bondade só será ridícula quando já não houver dor e miséria... até lá, a bondade, a generosidade, a caridade serão sempre praticadas, reconhecidas e valorizadas. Sempre. Isso é tão humano quanto o que há de mais odioso em nós.
.
E você sabe disso - claro que sabe -, mas talvez esteja triste demais para lembrar; talvez cansado demais para seguir... Confesso que continuei a minha leitura com uma dor no coração, com uma saudade apertada, atravessada, pensando na dureza da vida quando as forças para caminhar escasseiam... quando de repente - não mais que de repente -, ao me aproximar do final da matéria, me deparo com a seguinte informação:
.
Lançamento do livro "A Viagem do Elefante" no Rio - Quarta-feira, 26/11, às 17h30, no salão nobre do Petit Trianon da Academia Brasileira de Letras - Avenida Presidente Wilson, 203, Castelo - Tel: 21 3974-2500.
Adivinha?!
Amanhã vou tomar o chá das cinco com José, vou lhe dar um abraço bem apertado e lhe dizer - com sorte - que ele nem sabe, mas o mundo já foi salvo, graças a ele.

Um abraço em José

Passando os olhos pelo O Globo on line antes de dormir, vejo lá a matéria de Márcia Abos, fresquinha, publicada às 19h43min, com a chamada:
.
"Não sou pessimista, o mundo é que é péssimo", desabafa Saramago".
.
Como assim...???
Fiquei preocupada...
.
José Saramago está no Brasil para o lançamento do seu livro "A Viagem do Elefante" e inauguração da exposição "A Consistência dos Sonhos" que reúne mais de 1.200 peças do autor entre documentos, manuscritos, primeiras edições, agendas e coisa e tal.
.
Diz a matéria que esse homem, que me falou pela primeira vez de uma cegueira branca que era a minha; que me falou daquela coisa que não tem nome, que não tem certo, que não tem rota, que somos nós; que me falou da imensa responsabilidade daqueles que enxergam a miséria humana frente aos outros que apenas sofrem na mesma condição; que esse homem, hoje triste, "instaurou a perplexidade" entre os jornalistas, no Consulado de Portugal, na entrevista coletiva concedida esta tarde, ao declarar que:
.
"- Nessa longa história da humanidade, em que ponto tomamos uma direção errada que nos levou ao desastre que estamos hoje, do qual somos responsáveis? A literatura pode salvar o mundo? Mas salvar o mundo como? Principalmente depois de tudo o que já se escreveu. Como não conseguimos mudar o rumo de nossas vidas?"
.
[Como não? Como não?!! Como não???!!!!!!]
.
E continuou o mestre: "Quantos delinqüentes existem no mundo? A violência já atingiu o nível da barbárie. A corrupção chegou a tal ponto que é um problema de linguagem. A palavra bondade hoje significa qualquer coisa de ridículo. É preciso conquistar, triunfar. Ninguém se arrisca a dizer que o seu objetivo é ser bom. Querer ser bom em uma época como esta é se apresentar como voluntário para a eliminação. Como chegamos a isso? - indagou sinalizando que a saída é a transformação individual - para mudarmos a vida, é preciso mudarmos de vida".
.
Sim, José, é preciso mudarmos de vida, para mudarmos a vida, sem dúvida, e seguindo o mesmo raciocínio, é preciso salvarmos a nós mesmos para salvarmos o mundo. E quando se pergunta se a literatura pode salvar o mundo, fico aqui pensando em quantas vidas não já foram salvas, não mudaram de rumo, de rota e se transformaram por completo através da literatura, da SUA literatura, José, quantas? Penso que o mundo é salvo assim: toda vez que uma vida é salva. É o mundo de cada um, é a vida em sua melhor expressão. E A bondade só será ridícula quando já não houver dor e miséria... até lá, a bondade, a generosidade, a caridade serão sempre praticadas, reconhecidas e valorizadas. Sempre. Isso é tão humano quanto o que há de mais odioso em nós.
.
E você sabe disso - claro que sabe -, mas talvez esteja triste demais para lembrar; talvez cansado demais para seguir... Confesso que continuei a minha leitura com uma dor no coração, com uma saudade apertada, atravessada, pensando na dureza da vida quando as forças para caminhar escasseiam... quando de repente - não mais que de repente -, ao me aproximar do final da matéria, me deparo com a seguinte informação:
.
Lançamento do livro "A Viagem do Elefante" no Rio - Quarta-feira, 26/11, às 17h30, no salão nobre do Petit Trianon da Academia Brasileira de Letras - Avenida Presidente Wilson, 203, Castelo - Tel: 21 3974-2500.
Adivinha?!
Amanhã vou tomar o chá das cinco com José, vou lhe dar um abraço bem apertado e lhe dizer - com sorte - que ele nem sabe, mas o mundo já foi salvo, graças a ele.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Entenda o meu DNA - Parte II

- Me prende que eu quero ver!
- E... leva a mal não, mas do Al Capone era maior.

Poster de Elliot Ness em Navy Pier, Chicago, 2008.

Entenda o meu DNA - Parte II

- Me prende que eu quero ver!
- E... leva a mal não, mas do Al Capone era maior.

Poster de Elliot Ness em Navy Pier, Chicago, 2008.

sábado, 22 de novembro de 2008

Entenda o meu DNA

(Segura mãe! Segura que é ele mesmo!!! Bonovox, Bono... Bonotudo!!!)
.
U2 Tour, Chicago, 2008.

Entenda o meu DNA

(Segura mãe! Segura que é ele mesmo!!! Bonovox, Bono... Bonotudo!!!)
.
U2 Tour, Chicago, 2008.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Tratamento

"A maior e melhor parte do remédio
está no próprio enfermo".
(Machado de Assis)
.
Boletim jurídico também é cultura!
E salve o Migalhas!
.
Um excelente final de semana a todos!

Tratamento

"A maior e melhor parte do remédio
está no próprio enfermo".
(Machado de Assis)
.
Boletim jurídico também é cultura!
E salve o Migalhas!
.
Um excelente final de semana a todos!

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Aquilo que não tem nome

"Palavra é disfarce de uma coisa mais grave, surda-muda, foi inventada para ser calada. Em momentos de graça, infreqüentíssimos, se poderá apanhá-la: um peixe vivo com a mão. Puro susto e terror". .
.
(Adélia Prado em "Poesia Reunida")

Aquilo que não tem nome

"Palavra é disfarce de uma coisa mais grave, surda-muda, foi inventada para ser calada. Em momentos de graça, infreqüentíssimos, se poderá apanhá-la: um peixe vivo com a mão. Puro susto e terror". .
.
(Adélia Prado em "Poesia Reunida")

domingo, 16 de novembro de 2008

Meu Amor

"Querida Isabela,

Feliz aniversário!!
Desejo-lhe, de coração, toda a felicidade, essa mesma que, desde seus primeiros passos, você tem dado a todos aqueles que chegam perto, essa mesma que só você sabe despertar, sabe fazer vibrar ao seu redor.
Você nasceu para transformar a vida em arte e, desde o seu primeiro choro, música, desde suas primeiras palavras, poesia, desde suas primeiras aventuras, trilhas, aí está a vida mais dengosa - graças a você, aí está a vida linda - que você faz e refaz, que você inventa e compartilha, que você entrega e afaga.
Obrigado, meu amor, por toda essa vida que você me dá.
O seu aniversário será para sempre o dia em que a vida ficou bela!!
Com todo o meu amor,"

O Meu Amor!!!

Meu Amor

"Querida Isabela,

Feliz aniversário!!
Desejo-lhe, de coração, toda a felicidade, essa mesma que, desde seus primeiros passos, você tem dado a todos aqueles que chegam perto, essa mesma que só você sabe despertar, sabe fazer vibrar ao seu redor.
Você nasceu para transformar a vida em arte e, desde o seu primeiro choro, música, desde suas primeiras palavras, poesia, desde suas primeiras aventuras, trilhas, aí está a vida mais dengosa - graças a você, aí está a vida linda - que você faz e refaz, que você inventa e compartilha, que você entrega e afaga.
Obrigado, meu amor, por toda essa vida que você me dá.
O seu aniversário será para sempre o dia em que a vida ficou bela!!
Com todo o meu amor,"

O Meu Amor!!!

sábado, 15 de novembro de 2008

Bukowski

Ontem a festa foi minha, mas o anfitrião, BUKOWSKI, prá variar, inspirou alguns a perderem a rédea, a pose, o prumo, e a mim garantiu longas e sonoras gargalhadas com essa "lição do dia" que faço questão de compartilhar com vocês, incorrigíveis amantes da palavra!!!.
.
Como Ser um Grande Escritor
(por Charles Bukowski in "Essa Loucura Roubada que Não Desejo a Ninguém a Não Ser a Mim Mesmo Amém", tradução de Fernando Koproski)
.
"Você tem mais é que comer muitas mulheres
mulheres bonitas
e escrever uns poemas de amor decentes.
.
não se preocupe com a idade
e/ou novos talentos.
.
apenas beba mais cerveja
mais e mais cerveja
.
e vá às corridas ao menos uma vez por
semana

e ganhe
se possível.
.
aprender a ganhar é difícil -
qualquer porcão pode ser um bom perdedor.
.
e não se esqueça de Brahms
e de Bach e de sua
birita.
.
não faça muito exercício.
.
durma até o meio dia.
.
evite cartões de crédito
ou pagar qualquer coisa no
dia.
.
lembre-se que não existe um cu
nesse mundo que vale mais que $50
(em 1977)
.
e se você tiver a capacidade de amar
primeiro ame a si mesmo
mas sempre tenha em mente a possibilidade de
derrota total
ainda que a razão dessa derrota
pareça certa ou errada -
.
um gostinho de morte cedo não é necessariamente
uma coisa ruim.
.
fique longe de igrejas e bares e museus,
como a aranha seja
paciente -
o tempo é a cruz de todo mundo,
mais
solidão
derrota
traição
.
toda essa sujeira.
.
fique com a cerveja.
.
cerveja é o sangue contínuo.
.
um amor contínuo.
.
pegue uma boa máquina de escrever
e enquanto os passos vêm e vão
além da sua janela
bata nela
bata nela com força
.
como se fosse uma luta de pesos pesados
.
faça como o touro em sua primeira investida
e lembre-se dos velhões
que lutaram tão bem:
Hemingway, Céline, Dostoiévski, Hamsun.
se você acha que eles não enlouqueceram
em quartos minúsculos
assim como você faz agora
.
sem mulheres
sem comida
sem esperança
.
você então não está no ponto.
.
beba mais cerveja.
há tempo.
e se não houver
está tudo bem
também".

Bukowski

Ontem a festa foi minha, mas o anfitrião, BUKOWSKI, prá variar, inspirou alguns a perderem a rédea, a pose, o prumo, e a mim garantiu longas e sonoras gargalhadas com essa "lição do dia" que faço questão de compartilhar com vocês, incorrigíveis amantes da palavra!!!.
.
Como Ser um Grande Escritor
(por Charles Bukowski in "Essa Loucura Roubada que Não Desejo a Ninguém a Não Ser a Mim Mesmo Amém", tradução de Fernando Koproski)
.
"Você tem mais é que comer muitas mulheres
mulheres bonitas
e escrever uns poemas de amor decentes.
.
não se preocupe com a idade
e/ou novos talentos.
.
apenas beba mais cerveja
mais e mais cerveja
.
e vá às corridas ao menos uma vez por
semana

e ganhe
se possível.
.
aprender a ganhar é difícil -
qualquer porcão pode ser um bom perdedor.
.
e não se esqueça de Brahms
e de Bach e de sua
birita.
.
não faça muito exercício.
.
durma até o meio dia.
.
evite cartões de crédito
ou pagar qualquer coisa no
dia.
.
lembre-se que não existe um cu
nesse mundo que vale mais que $50
(em 1977)
.
e se você tiver a capacidade de amar
primeiro ame a si mesmo
mas sempre tenha em mente a possibilidade de
derrota total
ainda que a razão dessa derrota
pareça certa ou errada -
.
um gostinho de morte cedo não é necessariamente
uma coisa ruim.
.
fique longe de igrejas e bares e museus,
como a aranha seja
paciente -
o tempo é a cruz de todo mundo,
mais
solidão
derrota
traição
.
toda essa sujeira.
.
fique com a cerveja.
.
cerveja é o sangue contínuo.
.
um amor contínuo.
.
pegue uma boa máquina de escrever
e enquanto os passos vêm e vão
além da sua janela
bata nela
bata nela com força
.
como se fosse uma luta de pesos pesados
.
faça como o touro em sua primeira investida
e lembre-se dos velhões
que lutaram tão bem:
Hemingway, Céline, Dostoiévski, Hamsun.
se você acha que eles não enlouqueceram
em quartos minúsculos
assim como você faz agora
.
sem mulheres
sem comida
sem esperança
.
você então não está no ponto.
.
beba mais cerveja.
há tempo.
e se não houver
está tudo bem
também".

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Amigos, Amigos, Amigos!

Estava eu lá no sofá assistindo o final do Jornal Nacional, ainda com a roupa do trabalho, pensando com meus botões "prá quê que eu fui inventar três dias de comemoração...? Já estou com preguiça...".
.
[Cacete...]
.
Meia hora depois, no mesmo sofá, com a mesma roupa, pensei "ah, não quero ir hoje... estou sem saco... Quero dormir cedo".
.
[Já viu alguém pensar em não ir à sua própria festa de aniversário? Pois é...]
.
Cinco minutos depois toca o telefone. Meu melhor amigo do outro lado:
- E aí, tá animada?
- Não. Tô com sono.
- Vai como?
- Como "vai como"? Vou como sempre...
- Vai sozinha?
- Vou.
- Vamos juntos. A que hora a gente se encontra?
- ...
.
Levantei do sofá. Consegui chegar ao computador. Pensei em responder dois e-mails antes da festa - que já sei que vou. Toca o telefone novamente. Outra grande amiga:
- Oi, filha! E aí, tá animada?
- Em processo.
- Vem cá, tem vela aí na tua casa?
- Prá quê? - Perguntei.
- Pro bolo que eu comprei prá você!
- Hãn???
- Já sabendo que você não compraria um bolo pra levar pra boate, que você não gosta de organizar essas papagaiadas, comprei pra você, ora!
.
Puta que pariu!
Acabo de me lembrar porque preciso de três dias para comemorar o meu aniversário! É para celebrar a vida que tenho perto de todos vocês que eu tanto amo!
.
Até amanhã, meu povo! Com fotos da primeira parte do evento, garanto!

Amigos, Amigos, Amigos!

Estava eu lá no sofá assistindo o final do Jornal Nacional, ainda com a roupa do trabalho, pensando com meus botões "prá quê que eu fui inventar três dias de comemoração...? Já estou com preguiça...".
.
[Cacete...]
.
Meia hora depois, no mesmo sofá, com a mesma roupa, pensei "ah, não quero ir hoje... estou sem saco... Quero dormir cedo".
.
[Já viu alguém pensar em não ir à sua própria festa de aniversário? Pois é...]
.
Cinco minutos depois toca o telefone. Meu melhor amigo do outro lado:
- E aí, tá animada?
- Não. Tô com sono.
- Vai como?
- Como "vai como"? Vou como sempre...
- Vai sozinha?
- Vou.
- Vamos juntos. A que hora a gente se encontra?
- ...
.
Levantei do sofá. Consegui chegar ao computador. Pensei em responder dois e-mails antes da festa - que já sei que vou. Toca o telefone novamente. Outra grande amiga:
- Oi, filha! E aí, tá animada?
- Em processo.
- Vem cá, tem vela aí na tua casa?
- Prá quê? - Perguntei.
- Pro bolo que eu comprei prá você!
- Hãn???
- Já sabendo que você não compraria um bolo pra levar pra boate, que você não gosta de organizar essas papagaiadas, comprei pra você, ora!
.
Puta que pariu!
Acabo de me lembrar porque preciso de três dias para comemorar o meu aniversário! É para celebrar a vida que tenho perto de todos vocês que eu tanto amo!
.
Até amanhã, meu povo! Com fotos da primeira parte do evento, garanto!

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Vozes

"TERCEIRA - As vossas frases lembram-me a minha alma...
SEGUNDA - É talvez por não serem verdadeiras... Mal sei que as digo... Repito-as seguindo uma voz que não ouço que mas está segredando... Mas eu devo ter vivido realmente à beira-mar... Sempre que uma cousa ondeia, eu amo-a... Há ondas na minha alma... Quando ando embalo-me... Agora eu gostaria de andar... Não o faço porque não vale nunca a pena fazer nada, sobretudo o que se quer fazer... Dos montes é que eu tenho medo... É impossível que eles sejam tão parados e grandes... Devem ter um segredo de pedra que se recusam a saber que têm... Se desta janela, debruçando-me, eu pudesse deixar de ver montes, debruçar-se-ia um momento da minha alma alguém em quem eu me sentisse feliz...
(...)
PRIMEIRA - Vejo pela janela um navio ao longe. É talvez aquele que vistes...
SEGUNDA - Não, minha irmã; esse que vedes busca sem dúvida um porto qualquer... Não podia ser que aquele que eu vi buscasse qualquer porto...
PRIMEIRA - Por que é que me respondestes?... Pode ser. . Eu não vi navio nenhum pela janela... Desejava ver um e falei-vos dele para não ter pena... Contai-nos agora o que foi que sonhastes à beira-mar...
SEGUNDA - Sonhava de um marinheiro que se houvesse perdido numa ilha longínqua. Nessa ilha havia palmeiras hirtas, poucas, e aves vagas passavam por elas... Não vi se alguma vez pousavam... Desde que, naufragado, se salvara, o marinheiro vivia ali... Como ele não tinha meio de voltar à pátria, e cada vez que se lembrava dela sofria, pôs-se a sonhar uma pátria que nunca tivesse tido: pôs-se a fazer ter sido sua uma outra pátria, uma outra espécie de país com outras espécies de paisagens, e outra gente, e outro feitio de passarem pelas ruas e de se debruçarem das janelas... Cada hora ele construía em sonho esta falsa pátria, e ele nunca deixava de sonhar, de dia à sombra curta das grandes palmeiras, que se recortava, orlada de bicos, no chão areento e quente; de noite, estendido na praia, de costas e não reparando nas estrelas.
(...)
SEGUNDA - Durante anos e anos, dia a dia, o marinheiro erguia num sonho contínuo a sua nova terra natal... Todos os dias punha uma pedra de sonho nesse edifício impossível... Breve ele ia tendo um país que já tantas vezes havia percorrido. Milhares de horas lembrava-se já de ter passado ao longo de suas costas. Sabia de que cor soíam ser os crepúsculos numa baía do norte, e como era suave entrar, noite alta, e com a alma recostada no murmúrio da água que o navio abria, num grande porto do sul onde ele passara outrora, feliz talvez, das suas mocidades a suposta...
(...)
SEGUNDA (mais baixo, numa voz muito lenta) - Ao princípio ele criou as paisagens, depois criou as cidades; criou depois as ruas e as travessas, uma a uma, cinzelando-as na matéria da sua alma - uma a uma as ruas, bairro a bairro, até às muralhas dos cais de onde ele criou depois os portos... Uma a uma as ruas, e a gente que as percorria e que olhava sobre elas das janelas... Passou a conhecer certa gente, como quem a reconhece apenas... Ia-lhes conhecendo as vidas passadas e as conversas, e tudo isto era como quem sonha apenas paisagens e as vai vendo... Depois viajava, recordando, através do país que criara... E assim foi construindo o seu passado... Breve tinha uma outra vida anterior... Tinha já, nessa nova pátria, um lugar onde nascera, os lugares onde passara a juventude, os portos onde embarcara... Ia tendo tido os companheiros da infância e depois os amigos e inimigos da sua idade viril... Tudo era diferente de como ele o tivera - nem o país, nem a gente, nem o seu passado próprio se pareciam com o que haviam sido...
(...)
SEGUNDA - Um dia, que chovera muito, e o horizonte estava mais incerto, o marinheiro cansou-se de sonhar... Quis então recordar a sua pátria verdadeira..., mas viu que não se lembrava de nada, que ela não existia para ele... Meninice de que se lembrasse, era a na sua pátria de sonho; adolescência que recordasse, era aquela que se criara... Toda a sua vida tinha sido a sua vida que sonhara... E ele viu que não podia ser que outra vida tivesse existido... Se ele nem de uma rua, nem de uma figura, nem de um gesto materno se lembrava... E da vida que lhe parecia ter sonhado, tudo era real e tinha sido... Nem sequer podia sonhar outro passado, conceber que tivesse tido outro, como todos, um momento, podem crer... Ó minhas irmãs, minhas irmãs... Há qualquer coisa, que não sei o que é, que vos não disse... Qualquer coisa que explicaria isto tudo... A minha alma esfria-me... Mal sei se tenho estado a falar... Falai-me, gritai-me, para que eu acorde, para que eu saiba que estou aqui ante vós e que há coisas que são apenas sonhos...
PRIMEIRA (numa voz muito baixa) - Não sei que vos diga... Não ouso olhar para as cousas... Esse sonho como continua?...
SEGUNDA - Não sei como era o resto.... Mal sei como era o resto... Por que haverá mais?...
PRIMEIRA - E o que aconteceu depois?
SEGUNDA - Depois? Depois de quê? Depois é alguma cousa?... Veio um dia um barco... Veio um dia um barco... - Sim sim... só podia ter sido assim... - Veio um dia um barco, e passou por essa ilha, e não estava lá o marinheiro
TERCEIRA - Talvez tivesse regressado à pátria... Mas a qual?
PRIMEIRA - Sim, a qual? E o que teriam feito ao marinheiro? Sabê-lo-ia alguém?
SEGUNDA - Por que é que mo perguntais? Há resposta para alguma coisa?
(uma pausa)
TERCEIRA - Será absolutamente necessário, mesmo dentro do vosso sonho, que tenha havido esse marinheiro e essa ilha?
SEGUNDA - Não, minha irmã; nada é absolutamente necessário.
PRIMEIRA - Ao menos, como acabou o sonho?
SEGUNDA - Não acabou... Não sei... Nenhum sonho acaba... Sei eu ao certo se o não continuo sonhando, se o não sonho sem o saber, se o sonhá-lo não é esta coisa vaga a que eu chamo a minha vida?.. Não me faleis mais... Principio a estar certa de qualquer coisa, que não sei o que é... Avançam para mim, por uma noite que não é esta, os passos de um horror que desconheço... Quem teria eu ido despertar com o sonho meu que vos contei?... Tenho um medo disforme de que Deus tivesse proibido o meu sonho... Ele é sem dúvida mais real do que Deus permite... Não estejais silenciosas... Dizei-me ao menos que a noite vai passando, embora eu o saiba... Vede, começa a ir ser dia.. Vede: vai haver o dia real... Paremos... Não pensemos mais... Não tentemos seguir nesta aventura interior... Quem sabe o que está no fim dela?
(...)
PRIMEIRA - Não faleis mais, não faleis mais... Isso é tão estranho que deve ser verdade. Não continueis... O que íeis dizer não sei o que é, mas deve ser de mais para a alma o poder ouvir... Tenho medo do que não chegastes a dizer... Vede, vede, é dia já... Vede o dia... Fazei tudo por reparardes só no dia, no dia real, ali fora... Vede-o, vede-o... Ele consola.. Não penseis, não olheis para o que pensais... Vede-o a vir, o dia... Ele brilha como ouro numa terra de prata. As leves nuvens arredondam-se à medida que se coloram.. Se nada existisse, minhas irmãs?... Se tudo fosse, qualquer modo, absolutamente coisa nenhuma?... Porque olhastes assim?...
(Não lhe respondem. E ninguém olhara de nenhuma maneira.)
A MESMA - Que foi que dissestes e que me apavorou?... Senti-o tanto que mal vi o que era... Dizei-me o que foi, para que eu, ouvindo-o segunda vez, já não tenha tanto medo como dantes... Não, não... Não digais nada... Não vos pergunto isto para que me respondais, mas para falar apenas, para me não deixar pensar... Tenho medo de me poder lembrar do que foi... Mas foi qualquer coisa de grande e pavoroso como o haver Deus... Devíamos já ter acabado de falar... Há tempo já que a nossa conversa perdeu o sentido... O que é entre nós que nos faz falar prolonga-se demasiadamente... Há mais presenças aqui do que as nossas almas.. O dia devia ter já raiado.. Deviam já ter acordado... Tarda qualquer coisa... Tarda tudo... O que é que se está dando nas coisas de acordo com o nosso horror?... Ah, não me abandoneis... Falai comigo, falai comigo... Falai ao mesmo tempo do que eu para não deixardes sozinha a minha voz... Tenho menos medo à minha voz do que à ideia da minha voz, dentro de mim, se for reparar que estou falando...
TERCEIRA - Que voz é essa com que falais?... É de outra... Vem de uma espécie de longe...
PRIMEIRA - Não sei... Não me lembreis isso... Eu devia estar falando com a voz aguda e tremida do medo... Mas já não sei como é que se fala... Entre mim e a minha voz abriu-se um abismo... Tudo isto, toda esta conversa e esta noite, e este medo - tudo isto devia ter acabado, devia ter acabado de repente, depois do horror que nos dissestes... Começo a sentir que o esqueço, a isso que dissestes, e que me fez pensar que eu devia gritar de uma maneira nova para exprimir um horror de aqueles...
(...)
SEGUNDA - Não sinto nada... Sinto as minhas sensações como uma coisa que se sente... Quem é que eu estou sendo?... Quem é que está falando com a minha voz?... Ah, escutai,..
PRIMEIRA e TERCEIRA - Quem foi?
SEGUNDA - Nada. Não ouvi nada... Quis fingir que ouvia para que vós supusésseis que ouvíeis e eu pudesse crer que havia alguma coisa a ouvir... Oh, que horror, que horror íntimo nos desata a voz da alma, e as sensações dos pensamentos, e nos faz falar e sentir e pensar quando tudo em nós pede silêncio e o dia e a inconsciência da vida... Quem é a quinta pessoa neste quarto que estende o braço e nos interrompe sempre que vamos a sentir?
PRIMEIRA - Para quê tentar apavorar-me? Não cabe mais terror dentro de mim... Peso excessivamente ao colo de me sentir. Afundei-me toda no lodo morno do que suponho que sinto. Entra-me por todos os sentidos qualquer coisa que nos pega e nos vela. Pesam as pálpebras a todas as minhas sensações. Prende-se a língua a todos os meus sentimentos. Um sono fundo cola umas às outras as ideias de todos as meus gestos. Por que foi que olhastes assim?...
TERCEIRA (numa voz muito lenta e apagada) - Ah, é agora, é agora... Sim, acordou alguém... Há gente que acorda... Quando entrar alguém tudo isto acabará... Até lá façamos crer que todo este horror foi um longo sono que fomos dormindo... É dia já. Vai acabar tudo... E de tudo isto fica, minha irmã, que só vós sois feliz, porque acreditais no sonho..."
(Fernando Pessoa in "Poemas Dramáticos", O Marinheiro - O Drama Estático em um Quadro)

Vozes

"TERCEIRA - As vossas frases lembram-me a minha alma...
SEGUNDA - É talvez por não serem verdadeiras... Mal sei que as digo... Repito-as seguindo uma voz que não ouço que mas está segredando... Mas eu devo ter vivido realmente à beira-mar... Sempre que uma cousa ondeia, eu amo-a... Há ondas na minha alma... Quando ando embalo-me... Agora eu gostaria de andar... Não o faço porque não vale nunca a pena fazer nada, sobretudo o que se quer fazer... Dos montes é que eu tenho medo... É impossível que eles sejam tão parados e grandes... Devem ter um segredo de pedra que se recusam a saber que têm... Se desta janela, debruçando-me, eu pudesse deixar de ver montes, debruçar-se-ia um momento da minha alma alguém em quem eu me sentisse feliz...
(...)
PRIMEIRA - Vejo pela janela um navio ao longe. É talvez aquele que vistes...
SEGUNDA - Não, minha irmã; esse que vedes busca sem dúvida um porto qualquer... Não podia ser que aquele que eu vi buscasse qualquer porto...
PRIMEIRA - Por que é que me respondestes?... Pode ser. . Eu não vi navio nenhum pela janela... Desejava ver um e falei-vos dele para não ter pena... Contai-nos agora o que foi que sonhastes à beira-mar...
SEGUNDA - Sonhava de um marinheiro que se houvesse perdido numa ilha longínqua. Nessa ilha havia palmeiras hirtas, poucas, e aves vagas passavam por elas... Não vi se alguma vez pousavam... Desde que, naufragado, se salvara, o marinheiro vivia ali... Como ele não tinha meio de voltar à pátria, e cada vez que se lembrava dela sofria, pôs-se a sonhar uma pátria que nunca tivesse tido: pôs-se a fazer ter sido sua uma outra pátria, uma outra espécie de país com outras espécies de paisagens, e outra gente, e outro feitio de passarem pelas ruas e de se debruçarem das janelas... Cada hora ele construía em sonho esta falsa pátria, e ele nunca deixava de sonhar, de dia à sombra curta das grandes palmeiras, que se recortava, orlada de bicos, no chão areento e quente; de noite, estendido na praia, de costas e não reparando nas estrelas.
(...)
SEGUNDA - Durante anos e anos, dia a dia, o marinheiro erguia num sonho contínuo a sua nova terra natal... Todos os dias punha uma pedra de sonho nesse edifício impossível... Breve ele ia tendo um país que já tantas vezes havia percorrido. Milhares de horas lembrava-se já de ter passado ao longo de suas costas. Sabia de que cor soíam ser os crepúsculos numa baía do norte, e como era suave entrar, noite alta, e com a alma recostada no murmúrio da água que o navio abria, num grande porto do sul onde ele passara outrora, feliz talvez, das suas mocidades a suposta...
(...)
SEGUNDA (mais baixo, numa voz muito lenta) - Ao princípio ele criou as paisagens, depois criou as cidades; criou depois as ruas e as travessas, uma a uma, cinzelando-as na matéria da sua alma - uma a uma as ruas, bairro a bairro, até às muralhas dos cais de onde ele criou depois os portos... Uma a uma as ruas, e a gente que as percorria e que olhava sobre elas das janelas... Passou a conhecer certa gente, como quem a reconhece apenas... Ia-lhes conhecendo as vidas passadas e as conversas, e tudo isto era como quem sonha apenas paisagens e as vai vendo... Depois viajava, recordando, através do país que criara... E assim foi construindo o seu passado... Breve tinha uma outra vida anterior... Tinha já, nessa nova pátria, um lugar onde nascera, os lugares onde passara a juventude, os portos onde embarcara... Ia tendo tido os companheiros da infância e depois os amigos e inimigos da sua idade viril... Tudo era diferente de como ele o tivera - nem o país, nem a gente, nem o seu passado próprio se pareciam com o que haviam sido...
(...)
SEGUNDA - Um dia, que chovera muito, e o horizonte estava mais incerto, o marinheiro cansou-se de sonhar... Quis então recordar a sua pátria verdadeira..., mas viu que não se lembrava de nada, que ela não existia para ele... Meninice de que se lembrasse, era a na sua pátria de sonho; adolescência que recordasse, era aquela que se criara... Toda a sua vida tinha sido a sua vida que sonhara... E ele viu que não podia ser que outra vida tivesse existido... Se ele nem de uma rua, nem de uma figura, nem de um gesto materno se lembrava... E da vida que lhe parecia ter sonhado, tudo era real e tinha sido... Nem sequer podia sonhar outro passado, conceber que tivesse tido outro, como todos, um momento, podem crer... Ó minhas irmãs, minhas irmãs... Há qualquer coisa, que não sei o que é, que vos não disse... Qualquer coisa que explicaria isto tudo... A minha alma esfria-me... Mal sei se tenho estado a falar... Falai-me, gritai-me, para que eu acorde, para que eu saiba que estou aqui ante vós e que há coisas que são apenas sonhos...
PRIMEIRA (numa voz muito baixa) - Não sei que vos diga... Não ouso olhar para as cousas... Esse sonho como continua?...
SEGUNDA - Não sei como era o resto.... Mal sei como era o resto... Por que haverá mais?...
PRIMEIRA - E o que aconteceu depois?
SEGUNDA - Depois? Depois de quê? Depois é alguma cousa?... Veio um dia um barco... Veio um dia um barco... - Sim sim... só podia ter sido assim... - Veio um dia um barco, e passou por essa ilha, e não estava lá o marinheiro
TERCEIRA - Talvez tivesse regressado à pátria... Mas a qual?
PRIMEIRA - Sim, a qual? E o que teriam feito ao marinheiro? Sabê-lo-ia alguém?
SEGUNDA - Por que é que mo perguntais? Há resposta para alguma coisa?
(uma pausa)
TERCEIRA - Será absolutamente necessário, mesmo dentro do vosso sonho, que tenha havido esse marinheiro e essa ilha?
SEGUNDA - Não, minha irmã; nada é absolutamente necessário.
PRIMEIRA - Ao menos, como acabou o sonho?
SEGUNDA - Não acabou... Não sei... Nenhum sonho acaba... Sei eu ao certo se o não continuo sonhando, se o não sonho sem o saber, se o sonhá-lo não é esta coisa vaga a que eu chamo a minha vida?.. Não me faleis mais... Principio a estar certa de qualquer coisa, que não sei o que é... Avançam para mim, por uma noite que não é esta, os passos de um horror que desconheço... Quem teria eu ido despertar com o sonho meu que vos contei?... Tenho um medo disforme de que Deus tivesse proibido o meu sonho... Ele é sem dúvida mais real do que Deus permite... Não estejais silenciosas... Dizei-me ao menos que a noite vai passando, embora eu o saiba... Vede, começa a ir ser dia.. Vede: vai haver o dia real... Paremos... Não pensemos mais... Não tentemos seguir nesta aventura interior... Quem sabe o que está no fim dela?
(...)
PRIMEIRA - Não faleis mais, não faleis mais... Isso é tão estranho que deve ser verdade. Não continueis... O que íeis dizer não sei o que é, mas deve ser de mais para a alma o poder ouvir... Tenho medo do que não chegastes a dizer... Vede, vede, é dia já... Vede o dia... Fazei tudo por reparardes só no dia, no dia real, ali fora... Vede-o, vede-o... Ele consola.. Não penseis, não olheis para o que pensais... Vede-o a vir, o dia... Ele brilha como ouro numa terra de prata. As leves nuvens arredondam-se à medida que se coloram.. Se nada existisse, minhas irmãs?... Se tudo fosse, qualquer modo, absolutamente coisa nenhuma?... Porque olhastes assim?...
(Não lhe respondem. E ninguém olhara de nenhuma maneira.)
A MESMA - Que foi que dissestes e que me apavorou?... Senti-o tanto que mal vi o que era... Dizei-me o que foi, para que eu, ouvindo-o segunda vez, já não tenha tanto medo como dantes... Não, não... Não digais nada... Não vos pergunto isto para que me respondais, mas para falar apenas, para me não deixar pensar... Tenho medo de me poder lembrar do que foi... Mas foi qualquer coisa de grande e pavoroso como o haver Deus... Devíamos já ter acabado de falar... Há tempo já que a nossa conversa perdeu o sentido... O que é entre nós que nos faz falar prolonga-se demasiadamente... Há mais presenças aqui do que as nossas almas.. O dia devia ter já raiado.. Deviam já ter acordado... Tarda qualquer coisa... Tarda tudo... O que é que se está dando nas coisas de acordo com o nosso horror?... Ah, não me abandoneis... Falai comigo, falai comigo... Falai ao mesmo tempo do que eu para não deixardes sozinha a minha voz... Tenho menos medo à minha voz do que à ideia da minha voz, dentro de mim, se for reparar que estou falando...
TERCEIRA - Que voz é essa com que falais?... É de outra... Vem de uma espécie de longe...
PRIMEIRA - Não sei... Não me lembreis isso... Eu devia estar falando com a voz aguda e tremida do medo... Mas já não sei como é que se fala... Entre mim e a minha voz abriu-se um abismo... Tudo isto, toda esta conversa e esta noite, e este medo - tudo isto devia ter acabado, devia ter acabado de repente, depois do horror que nos dissestes... Começo a sentir que o esqueço, a isso que dissestes, e que me fez pensar que eu devia gritar de uma maneira nova para exprimir um horror de aqueles...
(...)
SEGUNDA - Não sinto nada... Sinto as minhas sensações como uma coisa que se sente... Quem é que eu estou sendo?... Quem é que está falando com a minha voz?... Ah, escutai,..
PRIMEIRA e TERCEIRA - Quem foi?
SEGUNDA - Nada. Não ouvi nada... Quis fingir que ouvia para que vós supusésseis que ouvíeis e eu pudesse crer que havia alguma coisa a ouvir... Oh, que horror, que horror íntimo nos desata a voz da alma, e as sensações dos pensamentos, e nos faz falar e sentir e pensar quando tudo em nós pede silêncio e o dia e a inconsciência da vida... Quem é a quinta pessoa neste quarto que estende o braço e nos interrompe sempre que vamos a sentir?
PRIMEIRA - Para quê tentar apavorar-me? Não cabe mais terror dentro de mim... Peso excessivamente ao colo de me sentir. Afundei-me toda no lodo morno do que suponho que sinto. Entra-me por todos os sentidos qualquer coisa que nos pega e nos vela. Pesam as pálpebras a todas as minhas sensações. Prende-se a língua a todos os meus sentimentos. Um sono fundo cola umas às outras as ideias de todos as meus gestos. Por que foi que olhastes assim?...
TERCEIRA (numa voz muito lenta e apagada) - Ah, é agora, é agora... Sim, acordou alguém... Há gente que acorda... Quando entrar alguém tudo isto acabará... Até lá façamos crer que todo este horror foi um longo sono que fomos dormindo... É dia já. Vai acabar tudo... E de tudo isto fica, minha irmã, que só vós sois feliz, porque acreditais no sonho..."
(Fernando Pessoa in "Poemas Dramáticos", O Marinheiro - O Drama Estático em um Quadro)

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Da nova série “No Divã de Sabão”

.
Episódio de hoje:
“O Fálico-Narcisista e os Satélites do Mal”
.
Muito puto da sua vida, o amigo liga e diz:

- Alô. Tá ocupada, filha? Posso falar contigo...?
- Claro... Diz aí. Está tudo bem?!
- Não. Tô péssimo... Não agüento mais. O namoro está uma merda...
- Xi... - Entre uma jurisprudência e outra, nem pensei duas vezes: abandonei o STJ e puxei a cadeira imaginária.

- Olha só, vê se eu não tenho razão. Eu só tenho três programas "religiosos" durante a semana: o tênis na segunda, a corrida na quarta e o choppinho sagrado na sexta. O resto do tempo eu tenho todo livre para ficar com ela. Eu não me importo que ela tenha os seus programas também, claro que não, mas novela na hora do meu jantar, não dá. Eu quero conversar e ela me manda ficar quieto, diz que só na hora do comercial. E ainda reclama que eu sou egoísta, imagine só... Resolve falar no telefone justo na hora do meu jornal e não está nem aí se eu quero silêncio. Gasta com futilidades e quando eu peço explicações diz que não é da minha conta. Ela está cada vez mais agressiva e não percebe que está me afastando assim...

- Sei... – Na impossibilidade de falar qualquer coisa diferente disso naquele momento-desabafo...

- Sabe, andei pensando... Acho que as pessoas são como planetas com vários satélites em volta. Uns “do bem” e outros “do mal”, digamos assim. Os satélites do bem produzem uma força de atração entre os planetas. Os satélites do mal repelem uns aos outros e fazem com que os planetas se afastem. Se para aqueles dois planetas há mais satélites bons do que ruins, eles vão se manter próximos, unidos. Se, ao contrário, os satélites maus estiverem em maior quantidade, os planetas vão começar a se afastar, podendo se perder um do outro para sempre. A minha namorada tem muitas virtudes, sem dúvida, a amo muito, mas se os seus defeitos continuarem se expandindo desta forma no relacionamento, acho que vamos acabar terminando...

- E o que pretende fazer em relação a isso? – Perguntei.

- Como assim? Nada!!! Como posso fazer com que ela mude o seu...

- Pára, fio, pára tudo! - Interrompi - Você não está vendo que está falando de você aí, não??!

- Hãn???

- Você também tem “satélites” bons e ruins, ou não...?!

Silêncio.

- Já parou para pensar que talvez os seus “satélites do mal” estejam igualmente insuportáveis para ela...?

O amigo antes puto, agora refletia - confuso - sobre a possibilidade.

- Eu estou aqui escutando você falar que cobra, cobra, cobra, exige, exige, exige. Que saco isso, hein?! Como se ela tivesse que lhe dar respostas o tempo todo para poder continuar orbitando em torno de você, é isso mesmo?! Sei não, mas fico aqui pensando se essa novela, o telefone, o “escambau”, já não são as formas que ela JÁ encontrou de tocar o “planetinha” dela daí...

- CACETE! - Ele pulou - Será?!!

- Sei não... Pensa bem... Se você quer mesmo a companhia dela, porque não experimenta ao invés de cobrar e exigir, fazer um pouquinho a sua parte? Tenta ficar junto dela na hora da novela, por exemplo, para ver o que acontece... Amanhã, quem sabe, ela desliga a televisão e vem jantar contigo para bater papo...

Ele pensou um pouquinho e, inconsolável, respondeu:

- Porra, amiga, novela é FODA.

- E quem te disse que a vida é fácil, meu amigo, quem te disse?

Da nova série “No Divã de Sabão”

.
Episódio de hoje:
“O Fálico-Narcisista e os Satélites do Mal”
.
Muito puto da sua vida, o amigo liga e diz:

- Alô. Tá ocupada, filha? Posso falar contigo...?
- Claro... Diz aí. Está tudo bem?!
- Não. Tô péssimo... Não agüento mais. O namoro está uma merda...
- Xi... - Entre uma jurisprudência e outra, nem pensei duas vezes: abandonei o STJ e puxei a cadeira imaginária.

- Olha só, vê se eu não tenho razão. Eu só tenho três programas "religiosos" durante a semana: o tênis na segunda, a corrida na quarta e o choppinho sagrado na sexta. O resto do tempo eu tenho todo livre para ficar com ela. Eu não me importo que ela tenha os seus programas também, claro que não, mas novela na hora do meu jantar, não dá. Eu quero conversar e ela me manda ficar quieto, diz que só na hora do comercial. E ainda reclama que eu sou egoísta, imagine só... Resolve falar no telefone justo na hora do meu jornal e não está nem aí se eu quero silêncio. Gasta com futilidades e quando eu peço explicações diz que não é da minha conta. Ela está cada vez mais agressiva e não percebe que está me afastando assim...

- Sei... – Na impossibilidade de falar qualquer coisa diferente disso naquele momento-desabafo...

- Sabe, andei pensando... Acho que as pessoas são como planetas com vários satélites em volta. Uns “do bem” e outros “do mal”, digamos assim. Os satélites do bem produzem uma força de atração entre os planetas. Os satélites do mal repelem uns aos outros e fazem com que os planetas se afastem. Se para aqueles dois planetas há mais satélites bons do que ruins, eles vão se manter próximos, unidos. Se, ao contrário, os satélites maus estiverem em maior quantidade, os planetas vão começar a se afastar, podendo se perder um do outro para sempre. A minha namorada tem muitas virtudes, sem dúvida, a amo muito, mas se os seus defeitos continuarem se expandindo desta forma no relacionamento, acho que vamos acabar terminando...

- E o que pretende fazer em relação a isso? – Perguntei.

- Como assim? Nada!!! Como posso fazer com que ela mude o seu...

- Pára, fio, pára tudo! - Interrompi - Você não está vendo que está falando de você aí, não??!

- Hãn???

- Você também tem “satélites” bons e ruins, ou não...?!

Silêncio.

- Já parou para pensar que talvez os seus “satélites do mal” estejam igualmente insuportáveis para ela...?

O amigo antes puto, agora refletia - confuso - sobre a possibilidade.

- Eu estou aqui escutando você falar que cobra, cobra, cobra, exige, exige, exige. Que saco isso, hein?! Como se ela tivesse que lhe dar respostas o tempo todo para poder continuar orbitando em torno de você, é isso mesmo?! Sei não, mas fico aqui pensando se essa novela, o telefone, o “escambau”, já não são as formas que ela JÁ encontrou de tocar o “planetinha” dela daí...

- CACETE! - Ele pulou - Será?!!

- Sei não... Pensa bem... Se você quer mesmo a companhia dela, porque não experimenta ao invés de cobrar e exigir, fazer um pouquinho a sua parte? Tenta ficar junto dela na hora da novela, por exemplo, para ver o que acontece... Amanhã, quem sabe, ela desliga a televisão e vem jantar contigo para bater papo...

Ele pensou um pouquinho e, inconsolável, respondeu:

- Porra, amiga, novela é FODA.

- E quem te disse que a vida é fácil, meu amigo, quem te disse?

domingo, 9 de novembro de 2008

Fechada para Balanço


[Post auto-explicativo para aqueles dias em que você já não tem mais nada a dizer...]

Fechada para Balanço


[Post auto-explicativo para aqueles dias em que você já não tem mais nada a dizer...]

sábado, 8 de novembro de 2008

Tentar

"As energias voltam sempre que a esperança volta."
(José Saramago, "Jangada de Pedra")

Tentar

"As energias voltam sempre que a esperança volta."
(José Saramago, "Jangada de Pedra")

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

A Febre do Nevoeiro

Com lançamento previsto para meados do mês de dezembro, a minha próxima aquisição literária, “A Viagem do Elefante”, teve um trecho já divulgado por José Saramago no blog Fundação que leva o seu nome, que foi publicado no Estadão digital em 31.out.08.

Somos nós no nevoeiro...
Um bom final de semana a todos...

“Não há vento, porém a névoa parece mover-se em lentos turbilhões como se o próprio bóreas, em pessoa, a estivesse soprando desde o mais recôndito norte e dos gelos eternos. O que não está bem, confessemo-lo, é que, em situação tão delicada como esta, alguém se tenha posto aqui a puxar o lustro à prosa para sacar alguns reflexos poéticos sem pinta de originalidade. A esta hora os companheiros da caravana já deram com certeza pela falta do ausente, dois deles declararam-se voluntários para voltar atrás e salvar o desditoso náufrago, e isso seria muito de agradecer se não fosse a fama de poltrão que o iria acompanhar para o resto da vida, Imaginem, diria a voz pública, o tipo ali sentado, à espera de que aparecesse alguém a salvá-lo, há gente que não tem vergonha nenhuma. É verdade que tinha estado sentado, mas agora já se levantou e deu corajosamente o primeiro passo, a perna direita adiante, para esconjurar os malefícios do destino e dos seus poderosos aliados, a sorte e o acaso, a perna esquerda de repente duvidosa, e o caso não era para menos, pois o chão deixara de poder ver-se, como se uma nova maré de nevoeiro tivesse começado a subir. Ao terceiro passo já não consegue nem sequer ver as suas próprias mãos estendidas à frente, como para proteger o nariz do choque contra uma porta inesperada. Foi então que uma outra ideia se lhe apresentou, a de que o caminho fizesse curvas para um lado ou para o outro, e que o rumo que tomara, uma linha que não queria apenas ser recta, uma linha que queria também manter-se constante nessa direcção, acabasse por conduzi-lo a páramos onde a perdição do seu ser, tanto da alma como do corpo, estaria assegurada, neste último caso com consequências imediatas. E tudo isto, ó sorte mofina, sem um cão para lhe enxugar as lágrimas quando o grande momento chegasse. Ainda pensou em voltar para trás, pedir abrigo na aldeia até que o banco de nevoeiro se desfizesse por si mesmo, mas, perdido o sentido de orientação, confundidos os pontos cardeais como se estivesse num qualquer espaço exterior de que nada soubesse, não achou melhor resposta que sentar-se outra vez no chão e esperar que o destino, a casualidade, a sorte, qualquer deles ou todos juntos, trouxessem os abnegados voluntários ao minúsculo palmo de terra em que se encontrava, como uma ilha no mar oceano, sem comunicações. Com mais propriedade, uma agulha em palheiro. Ao cabo de três minutos, dormia. Estranho animal é este bicho homem, tão capaz de tremendas insónias por causa de uma insignificância como de dormir à perna solta na véspera da batalha. Assim sucedeu. Ferrou no sono, e é de crer que ainda hoje estaria a dormir se salomão não tivesse soltado, de repente, em qualquer parte do nevoeiro, um barrito atroador cujos ecos deveriam ter chegado às distantes margens do ganges. Aturdido pelo brusco despertar, não conseguiu discernir em que direcção poderia estar o emissor sonoro que decidira salvá-lo de um enregelamento fatal, ou pior ainda, de ser devorado pelos lobos, porque isto é terra de lobos, e um homem sozinho e desarmado não tem salvação ante uma alcateia ou um simples exemplar da espécie. A segunda chamada de salomão foi mais potente ainda que a primeira, começou por uma espécie de gorgolejo surdo nos abismos da garganta, como um rufar de tambores, a que imediatamente se sucedeu o clangor sincopado que forma o grito deste animal. O homem já vai atravessando a bruma como um cavaleiro disparado à carga, de lança em riste, enquanto mentalmente implora, Outra vez, salomão, por favor, outra vez. E salomão fez-lhe a vontade, soltou novo barrito, menos forte, como de simples confirmação, porque o náufrago que era já deixara de o ser, já vem chegando, aqui está o carro da intendência da cavalaria, não se lhe podem distinguir os pormenores porque as coisas e as pessoas são como borrões indistintos (...)
Em princípio, diga-se, porque ao homem perdido no nevoeiro imaginação foi o que pareceu não lhe ter faltado, haja vista a ligeireza com que tirou do nada, do não acontecido, os voluntários que deveriam ter ido salvá-lo. Felizmente para a sua credibilidade pública, o elefante é outra coisa. Grande, enorme, barrigudo, com uma voz de estarrecer os tímidos e uma tromba como não a tem nenhum outro animal da criação, o elefante nunca poderia ser produto de uma imaginação, por muito fértil e dada ao risco que fosse. O elefante, simplesmente, ou existiria, ou não existiria. É portanto hora de ir visitá-lo, hora de lhe agradecer a energia com que usou a salvadora trombeta que deus lhe deu, se este sítio fosse o vale de josafá teriam ressuscitado os mortos, mas sendo apenas o que é, um pedaço bruto de terra portuguesa afogado pela névoa onde alguém (quem) esteve a ponto de morrer de frio e abandono, diremos, para não perder de todo a trabalhosa comparação em que nos metemos, que há ressurreições tão bem administradas que chega a ser possível executá-las antes do passamento do próprio sujeito. Foi como se o elefante tivesse pensado, Aquele pobre diabo vai morrer, vou ressuscitá-lo. E aqui temos o pobre diabo desfazendo-se em agradecimentos, em juras de gratidão para toda a vida, até que o cornaca se decidiu a perguntar, Que foi que o elefante lhe fez para que você lhe esteja tão agradecido, Se não fosse ele, eu teria morrido de frio ou teria sido comido pelos lobos, E como conseguiu ele isso, se não saiu daqui desde que acordou, Não precisou de sair daqui, bastou-lhe soprar na sua trombeta, eu estava perdido no nevoeiro e foi a sua voz que me salvou, Se alguém pode falar das obras e feitos de salomão, sou eu, que para isso sou o seu cornaca, portanto não venha para cá com essa treta de ter ouvido um barrito, Um barrito, não, os barritos que estas orelhas que a terra há-de comer ouviram foram três. O cornaca pensou, Este fulano está doido varrido, variou-se-lhe a cabeça com a febre do nevoeiro, foi o mais certo, tem-se ouvido falar de casos assim, Depois, em voz alta, Para não estarmos aqui a discutir, barrito sim, barrito não, barrito talvez, pergunte você a esses homens que aí vêm se ouviram alguma coisa. Os homens, três vultos cujos difusos contornos pareciam oscilar e tremer a cada passo, davam imediata vontade de perguntar, Onde é que vocês querem ir com semelhante tempo. Sabemos que não era esta a pergunta que o maníaco dos barritos lhes fazia neste momento e sabemos a resposta que lhe estavam a dar. Também não sabemos se algumas destas coisas estão relacionadas umas com as outras, e quais, e como. O certo é que o sol, como uma imensa vassoura luminosa, rompeu de repente o nevoeiro e empurrou-o para longe. A paisagem fez-se visível no que sempre havia sido, pedras, árvores, barrancos, montanhas. Os três homens já não estão aqui. O cornaca abre a boca para falar, mas torna a fechá-la. O maníaco dos barritos começou a perder consistência e volume, a encolher-se, tornou-se meio redondo, transparente como uma bola de sabão, se é que os péssimos sabões que se fabricam neste tempo são capazes de formar aquele maravilhas cristalinas que alguém teve o génio de inventar, e de repente desapareceu da vista. Fez plof e sumiu-se. Há onomatopeias providenciais. Imagine-se que tínhamos de descrever o processo de sumição do sujeito com todos os pormenores. Seriam precisas, pelo menos, dez páginas. Plof”.

(José Saramago, "A Viagem do Elefante")

A Febre do Nevoeiro

Com lançamento previsto para meados do mês de dezembro, a minha próxima aquisição literária, “A Viagem do Elefante”, teve um trecho já divulgado por José Saramago no blog Fundação que leva o seu nome, que foi publicado no Estadão digital em 31.out.08.

Somos nós no nevoeiro...
Um bom final de semana a todos...

“Não há vento, porém a névoa parece mover-se em lentos turbilhões como se o próprio bóreas, em pessoa, a estivesse soprando desde o mais recôndito norte e dos gelos eternos. O que não está bem, confessemo-lo, é que, em situação tão delicada como esta, alguém se tenha posto aqui a puxar o lustro à prosa para sacar alguns reflexos poéticos sem pinta de originalidade. A esta hora os companheiros da caravana já deram com certeza pela falta do ausente, dois deles declararam-se voluntários para voltar atrás e salvar o desditoso náufrago, e isso seria muito de agradecer se não fosse a fama de poltrão que o iria acompanhar para o resto da vida, Imaginem, diria a voz pública, o tipo ali sentado, à espera de que aparecesse alguém a salvá-lo, há gente que não tem vergonha nenhuma. É verdade que tinha estado sentado, mas agora já se levantou e deu corajosamente o primeiro passo, a perna direita adiante, para esconjurar os malefícios do destino e dos seus poderosos aliados, a sorte e o acaso, a perna esquerda de repente duvidosa, e o caso não era para menos, pois o chão deixara de poder ver-se, como se uma nova maré de nevoeiro tivesse começado a subir. Ao terceiro passo já não consegue nem sequer ver as suas próprias mãos estendidas à frente, como para proteger o nariz do choque contra uma porta inesperada. Foi então que uma outra ideia se lhe apresentou, a de que o caminho fizesse curvas para um lado ou para o outro, e que o rumo que tomara, uma linha que não queria apenas ser recta, uma linha que queria também manter-se constante nessa direcção, acabasse por conduzi-lo a páramos onde a perdição do seu ser, tanto da alma como do corpo, estaria assegurada, neste último caso com consequências imediatas. E tudo isto, ó sorte mofina, sem um cão para lhe enxugar as lágrimas quando o grande momento chegasse. Ainda pensou em voltar para trás, pedir abrigo na aldeia até que o banco de nevoeiro se desfizesse por si mesmo, mas, perdido o sentido de orientação, confundidos os pontos cardeais como se estivesse num qualquer espaço exterior de que nada soubesse, não achou melhor resposta que sentar-se outra vez no chão e esperar que o destino, a casualidade, a sorte, qualquer deles ou todos juntos, trouxessem os abnegados voluntários ao minúsculo palmo de terra em que se encontrava, como uma ilha no mar oceano, sem comunicações. Com mais propriedade, uma agulha em palheiro. Ao cabo de três minutos, dormia. Estranho animal é este bicho homem, tão capaz de tremendas insónias por causa de uma insignificância como de dormir à perna solta na véspera da batalha. Assim sucedeu. Ferrou no sono, e é de crer que ainda hoje estaria a dormir se salomão não tivesse soltado, de repente, em qualquer parte do nevoeiro, um barrito atroador cujos ecos deveriam ter chegado às distantes margens do ganges. Aturdido pelo brusco despertar, não conseguiu discernir em que direcção poderia estar o emissor sonoro que decidira salvá-lo de um enregelamento fatal, ou pior ainda, de ser devorado pelos lobos, porque isto é terra de lobos, e um homem sozinho e desarmado não tem salvação ante uma alcateia ou um simples exemplar da espécie. A segunda chamada de salomão foi mais potente ainda que a primeira, começou por uma espécie de gorgolejo surdo nos abismos da garganta, como um rufar de tambores, a que imediatamente se sucedeu o clangor sincopado que forma o grito deste animal. O homem já vai atravessando a bruma como um cavaleiro disparado à carga, de lança em riste, enquanto mentalmente implora, Outra vez, salomão, por favor, outra vez. E salomão fez-lhe a vontade, soltou novo barrito, menos forte, como de simples confirmação, porque o náufrago que era já deixara de o ser, já vem chegando, aqui está o carro da intendência da cavalaria, não se lhe podem distinguir os pormenores porque as coisas e as pessoas são como borrões indistintos (...)
Em princípio, diga-se, porque ao homem perdido no nevoeiro imaginação foi o que pareceu não lhe ter faltado, haja vista a ligeireza com que tirou do nada, do não acontecido, os voluntários que deveriam ter ido salvá-lo. Felizmente para a sua credibilidade pública, o elefante é outra coisa. Grande, enorme, barrigudo, com uma voz de estarrecer os tímidos e uma tromba como não a tem nenhum outro animal da criação, o elefante nunca poderia ser produto de uma imaginação, por muito fértil e dada ao risco que fosse. O elefante, simplesmente, ou existiria, ou não existiria. É portanto hora de ir visitá-lo, hora de lhe agradecer a energia com que usou a salvadora trombeta que deus lhe deu, se este sítio fosse o vale de josafá teriam ressuscitado os mortos, mas sendo apenas o que é, um pedaço bruto de terra portuguesa afogado pela névoa onde alguém (quem) esteve a ponto de morrer de frio e abandono, diremos, para não perder de todo a trabalhosa comparação em que nos metemos, que há ressurreições tão bem administradas que chega a ser possível executá-las antes do passamento do próprio sujeito. Foi como se o elefante tivesse pensado, Aquele pobre diabo vai morrer, vou ressuscitá-lo. E aqui temos o pobre diabo desfazendo-se em agradecimentos, em juras de gratidão para toda a vida, até que o cornaca se decidiu a perguntar, Que foi que o elefante lhe fez para que você lhe esteja tão agradecido, Se não fosse ele, eu teria morrido de frio ou teria sido comido pelos lobos, E como conseguiu ele isso, se não saiu daqui desde que acordou, Não precisou de sair daqui, bastou-lhe soprar na sua trombeta, eu estava perdido no nevoeiro e foi a sua voz que me salvou, Se alguém pode falar das obras e feitos de salomão, sou eu, que para isso sou o seu cornaca, portanto não venha para cá com essa treta de ter ouvido um barrito, Um barrito, não, os barritos que estas orelhas que a terra há-de comer ouviram foram três. O cornaca pensou, Este fulano está doido varrido, variou-se-lhe a cabeça com a febre do nevoeiro, foi o mais certo, tem-se ouvido falar de casos assim, Depois, em voz alta, Para não estarmos aqui a discutir, barrito sim, barrito não, barrito talvez, pergunte você a esses homens que aí vêm se ouviram alguma coisa. Os homens, três vultos cujos difusos contornos pareciam oscilar e tremer a cada passo, davam imediata vontade de perguntar, Onde é que vocês querem ir com semelhante tempo. Sabemos que não era esta a pergunta que o maníaco dos barritos lhes fazia neste momento e sabemos a resposta que lhe estavam a dar. Também não sabemos se algumas destas coisas estão relacionadas umas com as outras, e quais, e como. O certo é que o sol, como uma imensa vassoura luminosa, rompeu de repente o nevoeiro e empurrou-o para longe. A paisagem fez-se visível no que sempre havia sido, pedras, árvores, barrancos, montanhas. Os três homens já não estão aqui. O cornaca abre a boca para falar, mas torna a fechá-la. O maníaco dos barritos começou a perder consistência e volume, a encolher-se, tornou-se meio redondo, transparente como uma bola de sabão, se é que os péssimos sabões que se fabricam neste tempo são capazes de formar aquele maravilhas cristalinas que alguém teve o génio de inventar, e de repente desapareceu da vista. Fez plof e sumiu-se. Há onomatopeias providenciais. Imagine-se que tínhamos de descrever o processo de sumição do sujeito com todos os pormenores. Seriam precisas, pelo menos, dez páginas. Plof”.

(José Saramago, "A Viagem do Elefante")

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

A Rainha de Lenine

Rá!
Ganhei o meu dia!
Adivinha quem vem para o meu aniversário?
[Vai atrasar um pouquinho, mas o que importa é que ele vem...]
.

Lenine no Viva Rio, dia 29 de novembro!!!
E não é só isso!

Além de toda a sua inspiração, sua música – que eu amo, amo, amo –, e sua poesia maravilhosa, ele vem trazendo... FLORES!
[Que presentaço!]

SIM! Labiata é o título do novo álbum do moço, inspirado no nome de uma espécie de orquídea mais conhecida como a “Rainha do Nordeste Brasileiro”!

Segundo o artigo publicado no blog do Lenine em 18.jul.08 intitulado "Rainha", a inspiração do novo trabalho vem da exuberância da “Cattleya Labiata” que, “no final do verão e princípio do outono”, traz com suas flores uma beleza incontestável à vida dos orquidários, e um perfume inconfundível – único, arrebatador, inesquecível –, “exalado principalmente na parte da manhã” – justo no alvorecer, na aurora dos nossos dias.
[Em melhor momento não poderia ser...]

A Rainha está com tudo e não está prosa... nem verso, nem rima: hoje, ela está para além da poesia!!!

Ganhei o meu dia.