sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Rapto

(O coreógrafo Jerome Robbins ensaiando alguns passos com a bailarina Patrícia McBride, do New York Ballet, 1974. Fotografia de Martha Swope)

"Quando Werther 'descobre' Charlotte  (quando a cortina se rasga e o quadro aparece), ela está cortando pão. Hanold se apaixona por uma mulher que está andando (Gradiva: aquela que avança), e ainda por cima enquadrada num baixo-relevo. O que me fascina, me rapta, é a imagem de um corpo em situação. O que me excita é uma silhueta trabalhando que não presta atenção em mim: Groucha, a jovem empregada, causa profunda impressão no Homem dos Lobos: de joelhos, ela esfrega o chão. É porque a postura do trabalho me garante de alguma forma a 'inocência da imagem': quanto mais o outro me proporciona os signos da sua ocupação, da sua indiferença (da minha ausência), mais tenho certeza de surpreendê-lo, como se, para me apaixonar, fosse preciso cumprir a formalidade ancestral do rapto, a saber a surpresa (surpreendo o outro, e por isso mesmo ele me surpreende: eu não esperava surpreendê-lo)".

(Roland Barthes, "Fragmentos de um Discurso Amoroso", Rio de Janeiro: Fancisco Alves, 1994, p. 169)

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