quarta-feira, 24 de março de 2010

Fome

(Rubem Fonseca e Paula Parisot durante a performance da escritora em uma livraria no bairro de Pinheiros, São Paulo. Fotografia de Michel Filho/O Globo)
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Pois bem... Estava eu lá, serena da vida, vagando pelo O Globo em busca de novas notícias sobre o julgamento dos Nardoni, quando, de repente, me deparo com essa imagem desconcertante, com essa epifania do destino, essa poesia em forma de gente, e a notícia: "Rubem Fonseca faz rara aparição pública para 'alimentar' discípula literária em livraria".
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"Como assimmmm??", pensei cá com meus bolsinhos, e lá fui eu atrás da história - DE NOVO. Em entrevista à jornalista Márcia Abos, da coluna Prosa Online, em 22.mar.10, a moça disse o seguinte:
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"Eu conheci o Rubem Fonseca quando tinha 13, 14 anos, e a minha avó paterna me deu de presente o livro "Feliz Ano Novo". Lembro-me que fiquei apavorada quando li "Passeio Noturno", sobre aquele pai de família que à noite sai atropelando pessoas, mas, apesar do medo, passei a ler tudo do Rubem Fonseca. Muitos anos depois eu o conheci pessoalmente em uma padaria no Leblon. Eu o abordei e pedi que lesse um livro que eu estava escrevendo. Ele disse que leria e eu deixei o texto na portaria da casa dele no mesmo dia. Quinze dias depois, o Zé Rubem entrou em contato comigo e disse, 'você só não vai se tornar uma escritora se não quiser' e me aconselhou a me dedicar à literatura. Alguns desses contos que mostrei para ele estão em 'A Dama da Solidão' (Cia. das Letras, 2007) (...)".
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Ela nunca esqueceu aquele bonde... E com o primeiro livro publicado em 2007 pela Companhia das Letras - já na companhia de Rubem -, Paula Parisot se lançou ao segundo projeto, "Gonzos e Parafusos" - desta vez pela editora Leya -, que conta a história de Isabela, "uma psicanalista que decide se internar para se libertar do passado e mergulhar no presente". Oi?! Parece que é isso mesmo...
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E para marcar o lançamento do livro, Paula-Isabela mergulhou de cabeça, sem escafandro, no mergulho da personagem, e resolveu se trancar em um aquário de acrílico no meio de uma livraria em São Paulo, por sete dias, para experimentar... como direi... os seus próprios delírios. E assim fez. Numa tentativa de negar a existência do Outro que a amedronta, Paula-Isabela tentou ficar só; para escapar aos laços que a prendem e humanizam, tentou negar a palavra; mas o desejo falou mais forte, e a fome, mais uma vez, definiu a parada.
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Paula-Isabela tem mais medo da fome que da morte. E Rubem Fonseca sabe disso. Por isso foi até lá só para alimentá-la. Porque ele tem mais medo da morte que da fome. E a vida segue. E eles vão vivendo. Se alimentando. Um de cada lado do acrílico, do Atlântico, do sofá, não importa.
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"Sinto por Paula uma grande admiração. Ela é uma grande escritora que tem um futuro brilhante", disse ele à jornalista em meio ao encontro-desencontro prá lá de iluminado - não só pelos flashes dos repórteres.
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O que se comenta é que, depois de vinte anos de parceria, Rubem Fonseca deixou a Companhia das Letras (boa companhia até então), uniu-se à editora AGIR (é ou não é incrível essa história?!), e, no final da performance, transformado pela experiência, revelou contente à sua "discípula": "É isso aí, l'audace, et encore de l'audace, et toujours de l'audace!" (a audácia, novamente a audácia e sempre a audácia!).
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(Rubem Fonseca e Paula Parisot experimentando em São Paulo. Fotografia de Michel Filho/O Globo)

E se vocês ainda se perguntam se o livro da moça é bom ou não, me adiantarei a responder: Eu não sei... mas QUEM SE IMPORTA?! Essa história que eles inventaram é muito melhor!!!

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