quinta-feira, 23 de outubro de 2008

A Jornada dos Elefantes


Foi com imensa alegria que recebi a notícia de que o novo livro de José Saramago está terminado. Acabado. Finalizado. Pronto.
Foi no O Globo.
Foi outro dia.
Não falei nada antes porque achei que não tinha nada a ver.
Agora acho que tem.

O romance – que segundo Saramago não é romance, mas um conto – se chama “A Viagem do Elefante” e, como bem conta a jornalista Pilar del Rio, no blog da Fundação José Saramago, “descreve a viagem, ao mesmo tempo épica, prosaica e jovial, de um elefante asiático chamado Salomão, que, no século XVI, por alguns caprichos reais e absurdos desígnios teve de percorrer mais de metade da Europa”.

Diz Pilar que “A Viagem do Elefante é um livro coral onde as personagens entram, saem e se renovam de acordo com as peculiares exigências narrativas que o autor se impôs e lhes impôs. O elefante e o seu cornaca têm nome, como outras personagens que figuram nos manuais de história, embora apareçam também pessoas anónimas, gente com quem os membros da caravana se vão cruzando e com quem partilham perplexidades, esforços, ou a harmoniosa alegria de um tecto depois de tantas noites dormidas à intempérie”.

Pilar ainda adianta que “A Viagem do Elefante está pontuado de acordo com as regras de Saramago, os diálogos intercalam-se na narração, um todo que o leitor tem de organizar de acordo com a sua própria respiração. O leitor, esse ser fundamental que Saramago considera e respeita e a quem continuamente interpela, seja adiantando-lhe consequências de certos actos ou recordando-lhe outros, implicando-o no texto, porque escrever, como ler, não são acções inocentes, são tentativas para forçar a inteligência a ir um pouco mais longe, mais além de Viena, de Valladolid ou de Lisboa, mais além do que éramos ao acordar de manhã e encontrar-nos com mais um dia pela frente”.

Pois é, meus queridos... De fato, não sei o que nos reserva este livro-conto – no mínimo uma intensa viagem, em se tratando de uma obra de Saramago –, mas, sinceramente, muito mais me chamou atenção a paixão dessa mulher... Pilar. Del Rio.
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Olha o que ela nos diz ao final da matéria: “com estas linhas apenas pretendi dar a notícia de que vamos ter um novo livro de Saramago para incorporar na nossa vida de leitores. Não vos decepcionará, pelo contrário, ireis lê-lo, estou certa, com a mesma emoção com que foi escrito e sobrevooa cada linha, cada palavra. Não é um livro mais, é o livro que estávamos esperando e que chegou a bom porto, o leitor. Salomão, o elefante, não teve tanta sorte, mas disso não falarei, aguardemos o Outono, e então sim: aí, em vários idiomas simultaneamente, poderemos comentar páginas, aventuras, desenlaces. Os materiais da ficção, que são também os da vida”.

Há amor aí. Não há dúvida.
Senti em mim o amor dessa mulher e a curiosidade não me deixou ir embora. Precisava saber quem era ela. Conhecer sua história. E descobri. Um pequeníssimo fragmento de sua vida. De seu amor. Solto. Errante. Encantado nesse imenso oceano digital, na página de um Centro de Estudos de Lisboa, que reproduzo na íntegra para o deleite de todos nós:

Como descobre Saramago...
Por acaso, claro. Ela que se lembra de ‘estar a par de todas as novidades literárias’ nunca tinha ouvido falar de José Saramago até uma certa tarde de 1986, em que foi com umas amigas a uma livraria: ‘Vi um livro chamado O Memorial do Convento, e achei curioso o título. Li uma página, li o arranque, comprei, fui para casa e devorei-o’.

Regressou à livraria de Sevilha e comprou todos os Saramagos traduzidos: ‘Quando acabei de ler O Ano da Morte de Ricardo Reis foi uma comoção muito forte e decidi fazer o que não tinha feito nunca, senti a necessidade de seguir aquele itinerário lisboeta, senti que tinha a obrigação moral de dizer a José Saramago o que tinha experimentado com a obra. Um autor só acaba a sua obra quando o livro é lido e entendido. E eu queria dizer-lhe: completou-se o ciclo, li-o e entendi-o então, vim com o meu livro e com O Livro do Desassossego do Pessoa’. Aterrou na portela com o número de telefone de Saramago no bolso.

...os dois se encontram...

Estamos portanto em 1986, numa altura em que o romancista Saramago ainda está suficientemente disponível para ser ele a ir ter com a jornalista espanhola que lhe telefonou, entusiasmada. Aí vai ele a caminho do hotel Mundial, imprevidente, sem saber o que pode resultar de ‘tomar um café’. Com Pilar: ‘Eu estava no quarto, desci, saí do elevador e vi um senhor alto... não sei porquê tinha imaginado um homem baixo... apertámos as mãos, apanhámos um taxi, fomos ao cemitério dos Prazeres, ao túmulo de Pessoa, lemos um fragmento de Pessoa, voltámos ao hotel num táxi e despedimo-nos à porta, com um aperto de mãos’.

Não foi apenas isto, foi também o encontro entre dos marxistas convictos: ‘Falámos de política, do que se passava na Europa, e demo-nos conta de que estávamos no mesmo sítio, que os dois éramos marxistas, os dois éramos comunistas e aos dois nos interessava literatura’. Pilar Del Rio lembra-se de ter regressado a casa ‘com uma estranha paz’.

...se casam...

Na manhã seguinte Saramago telefonou-lhe para o hotel, a pedir-lhe a morada. ‘Eu regressei a Sevilha, ele enviou-me alguns livros... clássicos portugueses, enviei-lhe algumas críticas... eu não sabia nada da sua vida, nem ele da minha, porque não tínhamos falado das nossas vidinhas... e então, um dia, ele escreveu-me uma carta a dizer que, se as circunstâncias da minha vida o permitissem, iria visitar-me. E as circunstâncias da minha vida permitiam-no’.

Um ano depois estavam juntos, no ano seguinte casaram, em Lisboa. ‘Não tive dúvida nenhuma em vir viver para Lisboa. Não tive nenhum problema de adaptação, quando vim para cá, vim para minha casa’”.

(In Público, O folhetim de Pilar del Rio, 17 de Outubro de 1998.)

3 comentários:

Renata disse...

Seriam esses elefantes da Kamchatka?rs
Vale lembrar... Amo-te miga!!!

Isabela Dantas disse...

Não! São os tupiniquins mesmo!
Hoje você está demais!!!
Incorporada. Possuída. Enlouquecida!
Beijos, minha amiga querida!
TE AMOOO!!!

Renata disse...

Só hoje???rsrsrsrsrsr