terça-feira, 21 de outubro de 2008

Conduta

Sentada na Tribuna, a acusada apertava as mãos. Os olhos voltados para o chão rapidamente vieram para mim ao ser anunciado o início da audiência. Sorri para ela enquanto a testemunha-chave para a acusação acomodava-se diante do juiz.
De todos os fatos distorcidos lembrava-se bem.
Da verdade, não, afinal, havia muito tempo decorrido desde aquele massacre.
Dez anos.
Fazia dez anos que uma inocente apertava as mãos enquanto aguardava o julgamento dos homens.
Não o julgamento pelo massacre, porque este foi cometido contra ela, mas pelos fatos ali apurados.
Ao ser dada a palavra a defesa, perguntei à testemunha se naquela empresa as determinações da gerência eram cumpridas à risca por todos os funcionários; ao que foi respondido que sim, sem dúvida. Todos eram rigorosos cumpridores da lei.
Perguntei à testemunha se, ao tempo dos fatos, era ela titular de uma determinada autorização especial, que conferia aos seus responsáveis a possibilidade de realizar tarefas específicas e restritas; ao que respondeu que não, sem dúvida.
Perguntei se irregularidade como aquela, imputada à minha defendente, já havia acontecido no passado; ao que respondeu, já sem tanta certeza, dizendo que em tantos anos de empresa uma coisa aqui, outra ali, sempre acontece...
Perguntei então se, no passado, já foi a testemunha titular de uma autorização especial daquelas.
Silêncio.
Sim, respondeu a testemunha.
E alguma irregularidade como essa, atribuída à minha defendente, já foi praticada com o uso indevido por outro funcionário dessa autorização especial que era só sua?
Raiva.
Sim, respondeu a testemunha.
Então nos diga qual era a posição deste funcionário, que usava indevidamente a sua senha, na hierarquia da empresa.
E a testemunha olhou para mim pela primeira vez e respondeu: estagiário.
Sem mais perguntas, Excelência.

Ao final da audiência, o representante do Ministério Público não se conteve e perguntou ironicamente:
- Depois deste depoimento, me diga doutora, as testemunhas de defesa têm conhecimento dos fatos ou são testemunhas de mera "conduta"?
E eu lhe disse:
- Todas as testemunhas da defesa conhecem a história e, mais do que conduta, são testemunhas de moral.

3 comentários:

Renata disse...

Depois disso vc ainda tem dúvidas???rs
Bj Dra Isabela!

Isabela Dantas disse...

Claro que tenho dúvidas, minha amiga. Hoje e sempre. Afinal, como já disse o incrível poeta uruguaio Isidore Ducasse Lautréamont, "a dúvida é uma homenagem prestada à esperança"...
Um beijo.

Renata disse...

Uiiiiiiiiiiiiiiiiiii!rs
Amo-te